domingo, 30 de outubro de 2016

Olha a bola Manel...

Das minhas memórias de infância, vem-me à ideia a Vila Marecos.
Casas contiguas lembrando um western, uma época diferente, parado no tempo.
Um autentico cenário de um filme de cawboys  como os que se assistam todas as tardes de domingo, na casa de jantar da tia avó Maria. 
Os miúdos daquele gueto, reuniam-se em volta da velha mesa com braseiro e cadeiras de madeira que rangiam a cada movimento sobre elas. A televisão a preto e branco com um filtro de cor verde, um autentico altar, pendurado num canto da sala de paredes caiadas e portas grosseiras pintadas de verde água, onde não faltava um  quadro do menino da lágrima e outro de um  velho que por muito tempo julguei ser o retrato do tio Vitor, o marido da tia Maria, conhecido pelo "Vitor Malandro". 
Qual sala de cinema, qual "salon" do velho oeste, era o momento solene, a hora de culto, para aqueles rapazes com ar de quem tinha saído da série "Uma casa na Pradaria",  qual Tom Sawyer, saído das margens do Mississipi. Olhos vivos, sorrisos rasgados, rostos sujos do suor e poeira. Alguns diferentes, ruivos e com sardas, ao jeito da "Pipi das Meias Altas",todos com ar maroto, deliciavam-se com os copos cheios de gasosa e pão-de-ló feito na forma de fogão, receita da tia prima Fernanda, a solteirona, tão ruiva quanto eles. 
O jogo de futebol antes do filme já tinha queimado a galinha caseira com arroz de cabidela que tinham almoçado. 
Corriam atrás da bola, tropeções, rasteiras, pontapés, e quando algum pontapeava a bola que saltava para a estrada lá ia o mais velho  a correr busca-la. Manel, o mais velho dos netos da tia Maria,  rapaz feito, quase homem, já trabalhava, mas menino na hora da confraternização da rapaziada. 
"Olha a bola Manel" som de fundo que me soava ao ouvido. Eu a única menina no meio daquela "pandilha", a prima afastada que estava de visita, era vista coma a boneca de porcelana, impedida de jogar por ser menina. 
Entretinha-me no equilíbrio sobre o muro que separava "o estádio" da estrada cantando baixinho a musica de fundo daquela cena, aplaudia a cada grito de "GOLO!!!" que os rapazes entusiasticamente festejavam.
Se fosse hoje,  cantaria Carlos do Carmo,  pois pareciam mais um bando de pardais à solta. 
As visitas a Santarém, eram emocionantes autenticas viagens no tempo. 
Mas talvez seja  daí que vem a minha antipatia pelo futebol!...





Sílvia Q. Sanches - Outubro 2016

  



Sem comentários:

Enviar um comentário