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quinta-feira, 23 de março de 2017

O Sr Menino

"O menino é mau!"

Dizia o menino grande, com boquinha de mimo, sempre que fazia alguma asneira menos própria para a sua idade.
Homem a quem roubaram a infância, tendo que se "safar" desde que se deu como gente.
Menino que nunca deixou de sonhar e que até o dever levava a brincar.
Senhor de artes e ofícios, artimanhas e engenhocas, capaz de idealizar e construir os mais variados engenhos. 
Brinquedos, que nunca teve em menino, tornou reais em adulto e a brincar fez deles o seu negócio, e voou. 
Foi feliz fazendo felizes outros meninos... e as mães dos meninos... e as avós... as tias... as primas…
Desbocado galhofeiro, capaz de transformar o mais horrendo palavrão num elogio carinhoso, cantarolava e assobiava qual canário, qual “Rouxinol Faduncho” que ao jeito de “José Lito”, cantava “Lá Piconera” acompanhado da sua castanhola improvisada com a prótese, que passava mais tempo nas mãos que na própria boca.
O melhor da vida era uma mesa farta rodeada de família e amigos: "Comam, bebam!" Palavra de ordem daquela autoridade, condecorado com as belas medalhas das guerras comensais, e o seu velho boné à marinheiro “engatatão”. Com o seu ar de rezingão, lá ia comandando as tropas com os seus gritos de guerra. “É-mi-si-mi-não-mi” soava ao ronronar do gatinho que se tenta acalmar e “Ão Ão Ão” cachorrinho a pedir festinhas… Encantador, de espírito livre, alma grande em envolcro pequeno… “Homem pequeno ou velhaco ou dançarino”… também gostava de dançar!... “Queirosito” Sr menino, Sr Queirós o fotografo, homem das “redes macaenses, para as portas e contra o mau olhado”. 
Ladino, lutador, de garra, projectos e sonhos, tantos que nem todos realizou, o corpo não deixou.
A vida fê-lo assim e assim o levou.

Sílvia Queirós Sanches – Ao meu avô – Março 2017





segunda-feira, 11 de julho de 2016

A Casa da cultura


A minha infância foi vivida numa época de grandes mudanças causadas pela revolução do 25 de Abril. Os meus pais como tantos outros da sua geração, viviam aquele espírito com muita intensidade e conseguiram transmitir-me o entusiasmo do momento.
                                                   
Participei, com umas quantas dezenas de outras crianças, em actividades lúdicas ao ar livre, organizadas pela então Casa da Cultura, no Parque D. Carlos I. Desenhos e pinturas num papel de cenário desenrolado pelo chão do parque, trabalhar o barro ou plasticina em grandes mesas, (que alegria), ouvir concertos acústicos aos pés do Zé Barata Moura e do Zeca Afonso, saber de cor a Joana Come a Papa, o Olha a Bola Manel e o Grândola Vila Morena, eram coisas que faziam parte da vida social de qualquer criança da época, eu não fui excepção. .



Sílvia Q. Sanches


sexta-feira, 10 de junho de 2016

As Laranjas da "Ti Estrudes"


Algumas das memórias mais vincadas da minha infância, estão ligadas a uma tia carismática que vivia em Santarém. Gertrudes de seu nome, mais conhecida por "Ti Estrudes".
Vivi a infância convencida de que "Tiestrudes" era um nome próprio, de tal forma que sempre me dirigia ou referia a ela, dizia: - A tia "Tiestrudes", a tia das laranjas!!!!
Casa de campo modesta, construída pelo marido, avarento, que de simpatia e bondade nada devia ao divino, paredes finas e chão de cimento colorido, uma casa de banho sem banheira, outrora exterior, ligada à casa por uma sala de estar acrescentada ao longo dos anos, onde a família  se juntava. Todos se atropelavam para se sentar no velho banco de camião, o único e "sofisticadissimo" sofá de couro que existia na casa, bem ao lado da chaminé de chão onde existia um fogão de lenha em esmalte branco.
No fogão que aquecia a casa, fervia uma panela de ferro onde a "Tiestrudes" ia acrescentando os ingredientes secretos de uma sopa mágica da qual ainda guardo o sabor mas não mais saboreei.
A pandega tia, baixa e redondinha com a sua longa trança preta em carrapito, artisticamente enfeitado com ganchos de tartaruga, recebia como ninguém entre anedotas, graçolas, credos, "traques" disfarçados com o arrojar de bancos e histórias de família. Qual a fada madrinha da Cinderela, cheia de truques e magia, qual bruxinha do bem, cuja casa de cantos e recantos escondia tantos mistérios.
O relógio de cuco tocava todas a horas, compassadas pelo tique-taque constante, marcando o tempo interminável que se vivia naquele autentico local de culto.
Obrigatória era a visita ao quarto dos santinhos onde existia uma grande cómoda cujo altar com a Nossa Sra era rodeado de um grande presépio de santos de todas as "qualidades" e fotografias de todos os sobrinhos, irmãos, amigos e conhecidos.
A "Tiestrudes" era conhecida pelos seu dotes curandeiros e rezava todos os dias os seus santinhos pelo bem de todos que lhe pediam ajuda. O cheiro azeite que emanava das lamparinas e das tijelas meias de água onde observava, através de gotas de azeite, se a vida de cada um corria bem ou não.
O momento alto passava pela ligação da santinha à tomada exterior da velha instalação eléctrica, acendendo as luzes coloridas e o som agudo da musica dos pastorinhos.
A hora de dormir era um acontecimento. Um abrir e fechar de gavetas e baús de onde surgiam lençois de linho e cobertores de "papa" que picavam. As camas, mais estreitas do que eu estava habituada a ver em minha casa, eram feitas com todo esmero num ritual do bem receber tão típico da amorosa tia.
Dormir num quarto de anexo era sempre uma aventura. Especialmente pela madrugada, quando se acordava aos primeiros raios de sol com o galo e os melros como despertador.
O cheiro das laranjeiras que cobriam o alpendre, entrava pela janela de vidros martelados encaixados numa quadricula de ferro pintada de verde.
 As laranjas da "Tiestrudes" eram especiais. Apanhava-se um cesto delas, grandes, sujas de um pó preto que nos mascarrava.
Eram escolhidas uma a uma de preferência com filhos porque a "menina" gostava!
À refeição a minha mãe num toque de magia cortava da casca da laranja uns óculos que eu ostentava divertidamente.
Há memórias que ficam, pelos os sentidos que estimulam.
O cheiro inesquecível das laranjas, o calor do fogão de lenha, no sofá feito de banco de camião,
olhando o mundo através dos óculos cortados da casca da laranja, ao som do crepitar do lume... são das memórias que não mais esqueço.
Onde quer que esteja, provavelmente ao lado dos seus santinhos,  sei que a saudosa "Tiesturdes" continua, com a sua mão no peito e a sua gargalhada tão envolvente.
"Avé laranjas da Tiestrudes"!



Sílvia. Q. Sanches 29 Maio 2016 



quarta-feira, 27 de agosto de 2014

Renascer...

Nascer, morrer, renascer ainda e progredir sempre, tal é a lei.
Allan Kardec



Nada como umas férias longe do dia a dia para fazer renascer o ser adormecido dentro de cada um da nós.
Sinto força.